Kleber Lima

II

Uma mulher amarela despedaçava em minha boca.
Seus grandes olhos se mexiam lentamente como dunas no deserto.

Uma mulher com um mar inteiro na cabeça
descia correndo pelos meus dedos
ela carregava sacolas de fogos
e estava com um vestido estampado de abutres.

Uma mulher com uma grande fenda na testa
sentou-se na mesa do boteco em que eu mais gostava de beber
robou-me onetti e usou um canivete para talhar
as babas de robert walser sobre a neve.

Uma mulher-silêncio
com boca de revólver
me sorria reluzentemente
enquanto traduzia
para uma língua mais cotidiana
a forma contundente dos socos
da proliferação do câncer
do apagamento.

Uma mulher com anjos no estômago
beijou-me crocodilos pelo corpo inteiro.
Era a última mulher que me visitava nesta noite
em que eu tinha ficado acordado
do meu lado,
firme e satisfeito com minha própria companhia
até nascer o sol mais bonito que já vi na minha vida.