Jorge Wanderley

AL GUSTO

As pessoas deviam morrer em berços
ou barcos.
Vistas à distância,
como em fotografias.
Quem dá direitos a esta enfermeira
que mergulha tanto por meu corpo ainda vivo?
Quero morrer sem minúcias hospitalares,
sem esparadrapo,
sem supositórios,
sem tubulações que me entram (ou saem?)
pelo nariz,
sem qualquer outra pessoa
vendo que estou morrendo.
Quero uma decente e higiênica morte de bicho
entre rochedos
ou uma nuvem de poeira
como se alguma coisa galopasse mitológica
de mim para onde eu estava na realidade,
aquele indizível lugar de onde somos e não somos
e cuja marcas, às vezes
nos denunciam espalhafatosamente.
Vamos lá, morte de Ser Alado,
e não esta, pedestre,
que me oferecem entre cardiologias e soros-na-veia.
Morte mágica, viril, natural, cavalar:
de cavalo correndo, como o vejo agora
e dele já falei duas vezes.
Não esta, que me apontam, de pobre e manco animal,
sem ramos, sem estrelas, sem o amor alucinado dela,
sem a companhia da morte dela,
que com ela, sim, aí morreria bonito - de amor!
coo entre as cretinas do século dezoito.